17 de junho de 2011

Carta aos meus netos...


Pelo que vocês já me disseram com sotaque de anjo, percebo que me consideram uma pessoa grandona e desajeitada e que acham, mesmo assim, o seu melhor companheiro...
Pena que tenhamos tão pouco tempo para brincar, tão pouco, porque só sei brincar de passado e vocês só sabem brincar de futuro...
E ainda estarei brincando de recordações quando vocês começarem a brincar de esperança...

Mas antes que termine o nosso recreio juntos, antes que eu me torne apenas um retrato na parede, uma referência de meu genro, ou quem sabe uma lágrima de meus filhos, quero lhes dizer meus netos, que vale a pena!!!

Vale a pena crescer e estudar...
Vale a pena conhecer pessoas, ter namorados(as), sofrer algumas ingratidões, chorar decepções...
E, a despeito de tudo isso, ir renovando sua fé e a bondade essencial da criatura humana e o seu deslumbramento diante da vida...

Vale a pena conhecer que não há trabalho que não traga sua recompensa; que não há livro que não traga ensinamentos; que os amigos tem mais para dar que os inimigos para tirar; que se formos bons observadores, aprenderemos tanto com a obra do sábio quanto com a vida do ignorante...

Vale a pena casar e ter filhos...
Filhos, que nos escravizam com seu amor...
Vale a pena viver nesses assombrosos tempos modernos, em que milagres acontecem com o virar de um botão; em que se pode telefonar da Terra para a Lua; lançar sondas especiais; máquinas pensantes à fronteira de outros mundos e descobrir na humildade que toda essa maravilha tecnológica não consegue, entretanto, atrasar ou retardar um segundo que seja, a chegada da primavera...

Vale a pena, meus netos, mesmo quando vocês descobrirem que tudo que estou tentando ensinar é de pouca importância, porque a teoria não substitui a prática e que cada um tem que aprender por si mesmo que o fogo queima, que o vinagre amarga, que o espinho fere e que o pessimismo não resolve rigorosamente nada...

Vale a pena até mesmo envelhecer e ter netos como vocês, que me devolvam a infância...
Vale a pena ainda que eu parta cedo e as suas lembranças de mim se tornem vagas...

Mas, quando os outros disserem coisas boas a respeito de seus avós, quero que vocês digam de mim, simplesmente isso:
" Meu avô foi aquele que disse que VALIA A PENA... e não é que ele tinha razão???"

Flávio Cavalcanti